Afreudite, blog da blague "La valeur du message gît dans sa différence avec le code" "L´équivoque est la seule arme dont on dispose contre le symptôme" Lacan

Saturday, April 16, 2005

A Tomada da Pastilha

afreudite* A Tomada da Pastilha

Realizou-se recentemente, em Coimbra um encontro sobre vertigens. Ao que parece assiste-se ao aumento de queixas de vertigens, sobretudo entre os homens. No artigo de jornal onde respiguei a notícia referia-se, a propósito não sei de quê, que o corpo humano funcionava como um pêndulo invertido. Não sei se entendi bem a metáfora, mas o que me parece é que uma certa medicina inspirada por um discurso da ciência redutor, perde em não ter em conta, em recalcar (forcluir?), o que se poderia chamar o "pêndulo divertido".
Freud considerava que as análises dos homens giravam em grande medida e mesmo "patinavam" na chamada "angústia de castração".
Lacan dedicou um ano de Seminário ao afecto de angústia, afecto que de acordo com ele, era, entre todos os afectos o que não engana. Não engana porque remete para aquilo que ele designa como objecto (a) , objecto a pequeno. Este objecto constitui aquilo que o sujeito é, sem o saber, para o Outro (Autre, A grande). Procurando negar a falta, a castração do Outro (sobretudo materno), o sujeito "oferece-se", inconscientemente, como objecto susceptível de colmatar a sua falha . Este sacrifício pode revestir, como na psicose, a forma de mutilação (que envolve por vezes a auto-castração real).
Numa jornada de estudos em 1975 Lacan considera que o homem faz tudo o que pode para desfazer o "casamento com o petit pipi". Para alcançar este desiderato todos os meios são bons, entre eles a droga.
A propósito da droga, estudos recentes mostram que o consumo de tabaco , está a decrescer entre os homens (e a crescer entre as mulheres). Embora não disponha de estudos que comprovem o meu ponto de vista talvez não seja despropositado de todo estabelecer uma correlação entre a diminuição de consumo de tabaco entre os homens e o acréscimo de vertigens que afecta sobretudo os homens. Sabendo que o tabaco afecta a potência, a diminuição do consumo traduzir-se-á por um aumento das manifestações do "pêndulo divertido", com o concomitante aumento da angústia de "castração"... que se pode manifestar (histéricamente, conversivamente) como ... vertigem e, manifesta-se tanto mais quanto os clínicos não estão preparados nem têm tempo para escutarem devidamente os pacientes.
A "fast-medicine", a medicina da "era do homem sem qualidades", preocupada com a "objectividade" do sintoma , é obrigada a esquecer o sujeito ( do inconsciente), contribuindo para "reificar", fazer existir e consistir sintomas que ela se vê obrigada a tratar através de pastilhas por não reconhecer a sua dimensão (psiquica) de conversão histérica ...ad majorem gloriam do polvo farmacêutico que patrocina generosamente os estudos que promovam o consumo de medicamentos.
Ao valorizar o "sintoma aparente" avançado pelos pacientes, e ao debruçar-se exclusivamente sobre ele, as TCC , terapias cognitivo- comportamentais, incorrem no mesmo erro de conferir existência e consistência a uma manifestação patológica superficial que geralmente encobre o verdadeiro sintoma onde as questões do desejo, do gozo e da castração estão envolvidas.
É o que acontece com o chamado SGPT ( Stress de Guerra Post-Traumático) que afecta ex-combatentes, aqueles a quem chamaria os "Ultramados". O facto de estas pessoas terem estado expostas ao horror da guerra não torna equivalentes os seus problemas. A guerra não foi a causa mas um factor que contribuiu, de modo relevante, para pôr a nu a fragilidade de uma organização subjectiva que deveria ser assumida na sua singularidade. Ao ignorar a subjectividade envolvida, o terapeuta está a contribuir para "alienar" o paciente a uma suposta doença "observável" (clínica do olhar) que contribui para "cronicizar". Exemplo disso é o aparecimento de associações de pacientes colectivizados enganadoramente em torno de uma "patologia objectiva" como a dos ex-combatentes, dos "bipolares", dos "alcoólicos anónimos", etc.
Pinel libertou os loucos das grilhetas retomando, ao nível dos hospícios a gesta da Tomada da Bastilha .
Numa era em que a ideologia da ciência e as multinacionais farmacêuticas procuram convencer-nos através de estudos pseudo-científicos que existe para cada maleita uma solução bio-química, novos Pinéis (como Freud e Lacan) tornam-se necessários para nos libertarem da "Tomada da Pastilha".